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Por uma comunidade cristã profética

Miguel Debiasi

A comunidade é imprescindível. Todos precisam da comunidade. Existem comunidades clãs. Comunidades tribais. Comunidades de imigrantes. Comunidades virtuais. Comunidades ambientais. Comunidades familiares. Comunidades de vida religiosa. Comunidades eclesiais. Comunidades afins. Protótipos de comunidades é que não faltam em nosso tempo. Os cristãos mais do que ninguém precisam de uma comunidade para viver a fé em Cristo. Hoje, mais que outrora, é preciso constituir uma comunidade cristã profética para responder os desafios da fé em Cristo.

O conceito de comunidade é amplo como na experiência. Normalmente conceituamos a comunidade a luz do termo do latim communitas. O conceito latino refere-se à qualidade daquilo que é comum, das pessoas, de povos, de grupos, de cidades e outras. Este conceito nos permite definir distintas comunidades. Em termos globais fala-se em comunidade europeia, americana, africana, asiática, latina, na compreensão que pessoas, países e continentes estão vinculados por interesses e características comuns. Em termos específicos como da ecologia a comunidade chama-se de biocenose – que compreende a totalidade dos organismos vivos e que fazem parte do mesmo ecossistema e que se integram entre si. A sociologia compreende a comunidade como um grupo de pessoas que se organizam e vivem a partir de normas comuns. A ciência política compreende a comunidade como um grupo de países ou país que se organizam para garantir objetivos comuns. No mundo virtual a comunidade pode estar organizada em torno de um site e de certos influenciadores de opinião pública.

Já o termo communitate refere-se a grupos de indivíduos que compartilham a vida, algo que é de todos. Exemplo disto é a comunidade religiosa. No francês a comunidade religiosa corresponde ao compagnon que designa “aquele com quem se reparte o pão”. Jesus Cristo para anúncio da Boa Notícia do Evangelho do Reino de Deus constituiu uma comunidade de seguidores, nomeados de apóstolos, discípulos e discípulas (Marcos 3,13-19, Mateus 10,1-4, Lucas 6,12-16). Ele mesmo sendo Deus, fez na experiência de comunidade a mediação para realizar sua missão na terra. Convenhamos que Ele não fez qualquer experiência de comunidade. Foi uma experiência amorosa, redentora em todos os sentidos. A morte de cruz descreve à entrega total a sua comunidade (João 15,13-17). As aparições como Ressuscitado fortaleceu a sua comunidade frente aos desafios de testemunhar a vida de comunidade amorosa, libertadora, portanto, profética no mundo (João 20,19-31).

Quanto à comunidade do Mestre de Nazaré alguém poderia questionar que Jesus e seu projeto não foram bem aceitos por pessoas de seu tempo e na era contemporânea. Na narrativa bíblica as oposições a Jesus e a sua mensagem é o que não faltam, como dos escribas e dos fariseus (Mateus 23,1-39). A cruz é um claro sinal de não aceitação da mensagem de Jesus por parte dos chefes dos sacerdotes, do conselho dos anciãos, escribas e do Sinédrio e das autoridades políticas, como Pilatos (Marcos 15,1-39). O projeto de Jesus e a atitude de sua comunidade incomodou muita gente, sacerdotes, autoridades, como demonstra a entrada triunfante na cidade de Jerusalém (Lucas 19,28-40). O profetismo da comunidade de Jesus provocou inúmeras reações como esta da parte dos fariseus: “Mestre, repreende teus discípulos”. Responde Jesus se a comunidade silenciar seu profetismo “as pedras gritarão” (Lucas 19,39-40). A comunidade profética jamais silencia diante das injustiças e das oposições ao projeto de Deus.

Mesmo diante dos impedimentos, o profetismo da comunidade de Jesus deve ser testemunhado em vida por palavras e atitudes transformadoras. A comunidade cristã primitiva, mesmo perseguida com forte violência praticada pelas autoridades judaica, farisaica e romana não se recolheu ao silêncio. Expulsa dos espaços públicos a comunidade primitiva fez das casas o lugar de novas relações entre homens e mulheres e de intensa experiência de fé transformadora (Atos dos Apóstolos 2,1-13; 4,31). A comunidade cristã primitiva transformou seu profetismo também em novas relações econômicas partilhando bens, pão, experiência de vida (Atos dos Apóstolos 2,44-46). O profetismo dos primeiros cristãos superou a fome e a miséria (Atos dos Apóstolos 4,32-35). As marcas deste profetismo cristã permitiu a reintegração das pessoas excluídas na convivência social e na comunidade (Atos dos Apóstolos 3,1-10; 5,12-16).

Bem sabemos que na comunidade cristã primitiva existiam divergências, conflitos, problemas de relações entre culturas e etnias e de todas as espécies, mas seu profetismo manifestou tamanha fé em Cristo que levou a uma conversão social, de povos, cidades e até do poderoso império romano. A luz desta comunidade cristã não haverá hoje avanços na Igreja e entre os cristãos contemporâneos sem a radicalidade do Evangelho. À luz da vida de Cristo e de seu Evangelho, é preciso organizar a pastoral, as paróquias, dioceses para que se manifeste e se torna visível na vida dos cristãos contemporâneos o profetismo da Igreja primitiva. A ausência de profetismo é a marca da atual Igreja, a comunidade cristã, isto leva a suspeitar que não haja capacidade de levar o Evangelho até os confins do mundo para a conversão da humanidade inteira.  

   

 

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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