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Religiões: religar ou excluir?

Vanildo Luiz Zugno

A origem da palavra “religião” é controversa. Muitos sentidos para ela são indicados e cada um tem sua razão de ser. Me atenho aqui a apenas um. “Religião” teria sua origem no verbo “religar” com o sentido de restabelecer a relação, o encontro entre uma realidade e outra.

A maioria dos que adotam este sentido, pensam que religião é restabelecer a conexão entre o humano e o divino. Conexão rompida num passado mítico por alguma ação humana ou divina. Cada tradição religiosa tem um modo particular de pensar a ruptura e o restabelecimento dessa relação.

Mas há um outro sentido para o “religar” que também é plausível. “Religião” seria um modo de restabelecer as relações sociais. Ou seja, quando uma sociedade busca consolidar ou restabelecer uma coesão social, ela constrói um sistema religiosos no qual todos – voluntária ou involuntariamente – se sentem incluídos. Nesse caso, a identificação com a divindade é um meio para amalgamar os diferentes grupos sociais em torno a um projeto comum.

O exemplo mais claro para nós de formação cristã, é a comunidade religiosa da qual somos herdeiros, o judaísmo. Foi em torno ao culto a Javé/Eloim que se construiu a identidade judaica oriunda de diferentes grupos tribais. A fidelidade à aliança entre Javé/Eloim e o povo de Israel é o que garante a unidade e integridade da nação judaica.

Aliança que o cristianismo expande universalmente construindo um povo sem fronteiras étnicas, de gênero ou sociais. Foi a genialidade do apóstolo Paulo que ofereceu a base religiosa para a passagem de uma identidade social étnica à abertura universal onde toda a humanidade é vista como um único povo.

Senso de universalidade herdado pelo Islã quando Maomé faz a experiência de Allá como único Deus que deseja reunir toda a humanidade em um só povo.

Visto em outra perspectiva, desde o lado das realidades políticas, poderíamos citar o caso do Imperador Constantino que viu no cristianismo a possibilidade de religar o Império Romano ameaçado de esfacelamento. Ele não foi o único. Outros reis, imperadores e príncipes revestiram seu poder com a áurea religiosa para construir ou manter, conforme o caso, a unidade política em seus domínios. O cujus regio, eius religio do Tratado de Augsburgo, em 1555, que estabeleceu a trégua entre o católico romano Carlos V e os príncipes que haviam aderido à reforma da Igreja proposta por Lutero, é um outro exemplo clássico do papel das religiões na consolidação do poder político. Mesmo papel que tem a religião civil nos Estados Unidos da América que é, diga-se, um caso muito particular de uma não religião que tem uma clara função religadora da unidade nacional.

Mais recentemente, o “Deus, Pátria e Família” do fascismo salazarista de Portugal, adotado por movimentos totalitários em várias partes da América Latina, é outro exemplo de como a religião pode ser instrumentalizada para a consolidação de uma proposta de sociedade.

Tudo isso me faz pensar numa questão: qual é o papel das religiões numa sociedade? A experiência histórica nos ensina que elas não são apenas instrumentos para religar os humanos ao divino. Elas também têm um papel social. Elas são úteis para ligar os membros da sociedade. Ligação que pode ser inclusiva no modo do cristianismo ou exclusiva na opção dos regimes totalitários e das religiões que a eles se tornam subservientes que excluem da convivência social as pessoas consideradas diferentes ou incômodas para a sociedade

Se passarmos das macro relações sociais às situações do quotidiano na vivência religiosa, fica uma pergunta: a religião, tal qual eu a professo, ajuda a construir relações abertas e confiáveis ou leva ao medo do outro e à exclusão?

Pergunta que, nós, cristãos, deveríamos nos fazer em cada momento em que nos aproximamos da Comunhão.

Sobre o autor

Vanildo Luiz Zugno

Frade Menor Capuchinho na Província do Rio Grande do Sul. Graduado em Filosofia (UCPEL - Pelotas), Mestre (Université Catholique de Lyon) e Doutor em Teologia (Faculdades EST - São Leopoldo). Professor na ESTEF - Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana (Porto Alegre)."

 

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