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Menos luz, por favor

Gislaine Marins

Um dia desci ao armazém no pé da minha casa, que é uma espécie de assembleia informal do bairro, e as pessoas estavam passando um abaixo-assinado para pedir mais iluminação na rua.

- Quer assinar?

- Não.

Então expliquei que o problema da nossa rua não é a luz, é falta de gente. E por que falta gente?

Bem, ontem estava conversando com uma amiga brasileira e ela me perguntava se tinha alguma lojinha legal no bairro para comprar roupa barata. Respondi que todos os bairros têm lojinhas legais e cada um tem lojas diferentes umas das outras. Nem tudo é franchising.

Ela quis saber se em Roma havia shopping.

Sim, há vários. Há cerca de dez anos houve uma febre. O governo local concedeu concessões para a construção de vários monstros. É que eu chamo shopping de monstro. Monstro destruidor de bairros e de cidades.

Apontei para uma loja fechada:

- Está vendo? É o efeito da crise, mas também é o efeito desses monstros: muitos comerciantes não resistiram à crise e ao êxodo dos clientes para o shopping. É uma pena, pois quando não há lojinha nas ruas, há menos gente em circulação. Com menos pessoas nas ruas, a insegurança aumenta, pois vem a faltar aquele elemento subjetivo que pode levar o ladrão de ocasião a avaliar a presença de testemunhas. Se nos sentimos mais inseguros, tendemos a aumentar o nível de atenção, mas também de desconfiança e de medo. Quando temos medo, saímos menos. Daí achamos que o problema é a rua pouco iluminada. Não, o problema é o monstro.

Disse que não, que não iria aderir ao abaixo-assinado, e além de explicar a história do monstro que estava ferindo o nosso bairro, também falei do impacto ambiental, que quase não percebemos diante de outros problemas ecológicos: a poluição luminosa.

Temos luz demais nas ruas, já não conseguimos ver as estrelas. Os cientistas dizem que está cada vez mais difícil fazer observações do espaço: os telescópios devem ser instalados em regiões cada vez mais remotas para conseguirem captar os sinais luminosos do universo. A ciência é fundamental, sabemos. Mas os sonhos também são. Não existiria um pequeno príncipe se o seu autor não tivesse tido a oportunidade de olhar para as estrelas e sonhar outros mundos. A luz excessiva também mata a nossa imaginação.

Quero menos luz na minha rua e mais gente que se encontre e converse. Quero deixar a meu filho a possibilidade de imaginar raposas, rosas, serpentes, um universo inteiro nas estrelas, sabendo que aqui na terra sempre encontrará pessoas na rua e poderá nutrir o seu futuro de esperança.

Sobre o autor

Gislaine Marins

Doutora em Letras, tradutora, professora e mãe. Autora de verbetes para o Pequeno Dicionário de Literatura do Rio Grande do Sul (Ed. Novo Século) e para o Dicionário de Figuras e Mitos Literários das Américas (Editora da Universidade/Tomo Editorial). É autora do blog Palavras Debulhadas, dedicado à divulgação da língua portuguesa.

([email protected])

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