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A escravidão ronda a pátria

Miguel Debiasi

O trabalho escravo fere a dignidade e a consciência humana. Mas, para o governo federal as condições de trabalho degradantes e a dignidade humana parece não importunar, conforme Portaria MTB nº 1.129/2017, publicada no dia 16 de outubro no Diário Oficial da União. Ao publicar a Portaria de “condição análoga à de escravo” o governo atende os interesses dos poderosos, latifundiários, do agronegócio, de empresários desonestos.

A história da civilização e do Brasil foi manchada pela submissão de seres humanos à dura e penosa situação de escravidão. No período da escravidão as pessoas mais vitimadas foram os negros trazidos da África e os indígenas da América. A escravatura teve seu auge com o período do colonialismo. No Brasil os escravos negros foram trazidos da África pelos colonizadores europeus. Os colonizadores submeteram também os indígenas à escravidão, mas devido a sua resistência ao trabalho escravo no final do século XVIII foram abolidos. Mais sofrido foi com os escravos negros trazidos para o serviço da agricultura e para a atividade açucareira, de mineração e de serviços domésticos e urbanos. Estes, sob a força da violência se curvaram por longos anos de escravidão.

Em 1885 foi promulgada a Lei dos Sexagenários que garantia a liberdade aos escravos com mais de 60 anos idade. Mas, somente no final de século XIX é que a escravidão foi proibida no mundo. A Lei Áurea, da abolição da escravatura no Brasil foi assinada pela Princesa Isabel em 13 de maio de 1888. Contudo, o trabalho escravo continua no Brasil com a chamada escravidão moderna, através do trabalho compulsório e do tráfico de pessoas. Agora, por meio da Portaria MTB 1.129/2017, o governo federal facilita as condições que ferem a dignidade humana e não caracterizam trabalho escravo. Segundo a Portaria, para caracterizar a escravidão é necessário que o trabalhador seja cerceado em sua liberdade. Isto é, que o trabalhador seja forçado de maneira involuntária, sob a ameaça de punição e com uso de coação.

O professor e advogado trabalhista Nelson Mannrich vê como positiva a iniciativa do Ministério do Trabalho, porque a portaria avançou bastante sobre o conceito de trabalho, pois a anterior era muito genérica. Para o advogado e professor Gustavo Filipe Barbosa Garcia, o conceito “condição degradante” e “condição análoga à de escravo”, destoa do conceito contemporâneo utilizado pelo Código Penal. Diz que na escravidão moderna não precisa haver a coação direta contra a liberdade de ir e vir. A escravidão moderna é muito sutil e pode decorrer de diversas situações, muito além dos constrangimentos físicos, como o econômico, social, de condições indignas.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil divulgou nota repudiando a Portaria TMB 1.129/2017, que alterou conceitos de definição sobre trabalho escravo. Para os Bispos a medida é desumana porque elimina proteções legais: "A desumana Portaria é um retrocesso que, na prática, faz fechar os olhos dos órgãos competentes do Governo Federal que têm a função de coibir e fiscalizar esse crime contra a humanidade e insere-se na perversa lógica financista que tem determinado os rumos do nosso país", afirma a nota.

De fato, a Portaria do Ministério do Trabalho dá novo fôlego para uma realidade de escravatura, facilitando jornadas de trabalho exaustivas em condições degradantes, impedindo a fiscalização, atuação e a penalização da escravidão por parte dos órgãos públicos competentes. Na prática, a Portaria é um verdadeiro retrocesso por dificultar os órgãos do Governo de exercer sua função de coibir o trabalho escravo no país. Dessa forma, o sistema capitalista coloca o capital e o trabalho acima da dignidade da pessoa humana, buscando lucro e rendimentos sem limites. Na realidade a Portaria vem acompanhar a lei da terceirização do trabalho e o fim das Leis Trabalhistas. Em suma, lucro e segurança para o empregador.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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