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A metáfora da Ascensão

Vanildo Luiz Zugno

A metáfora é uma das figuras de linguagem mais utilizadas e mais poderosas. Através dela, transpomos o significado de algo já conhecido para algo ainda desconhecido e em processo de conhecimento. No falar ou escrever do dia-a-dia, utilizamos muitas metáforas. Na maior parte dos casos, fazemo-lo sem nos darmos conta.

Tal fenômeno é notável, sobretudo, na linguagem religiosa. Com efeito, falar de Deus implica em tentar dizer aquilo que ultrapassa a capacidade da expressão. Deus é indizível e incircunscritível. Como fazer com que caiba dentro de nossas palavras? Dele, só podemos dizer algo usando metáforas tiradas daquilo que nos é conhecido.

A nossa profissão de fé, o “Creio”, é cheio de metáforas. Uma delas é forte e famosa e está no imaginário de todas as pessoas cristãs. A de que “Jesus subiu as céus”. É uma metáfora que parece pois, na nossa fé, afirmamos que Deus é Espírito e habita em todos os lugares. Se é assim, como o afirmava o velho catecismo de São Belarmino, faz algum sentido tomar esta expressão de forma literal e imaginar Jesus subindo aos céus em meio às nuvens? O que esta metáfora, de fato, quer dizer?

Tomando como referência o imaginário bíblico e a cultura do mundo em que os textos foram que falam da Ascensão foram escritos, podemos afirmar que “subir aos céus” significa, conceitualmente, que Jesus é Deus. Tanto no mundo judaico como no mundo grego, imaginava-se os deuses morando nos lugares altos. As manifestações bíblicas de Deus aconteciam, normalmente, em lugares altos. O Monte Sion, o lugar onde estava construído o Templo de Jerusalém, mesmo não sendo a maior elevação da região, era tido pelos judeus como o lugar mais elevado da Terra. Para os gregos, os deuses moravam no monte Olimpo e, lá das alturas, contemplavam e, conforme o caso, premiavam ou castigavam os míseros mortais que habitavam as planícies.

A verdade de que Jesus, o Filho de Deus, é Deus com o Pai e o Espírito Santo, descrita na metáfora da Ascensão, foi elaborada conceitualmente e proclamada pela Igreja nos Concílios de Niceia e Calcedônia que abandonou a metáfora da Ascensão e afirmar a consubstancialidade entre o Pai e o Filho. Poucos cristãos sabem o que significa “consubstancial”. Mas todos, sem esforço, entendem a metáfora da Ascensão...

Por sua plasticidade, a metáfora é uma figura aberta. Ela é passível de novas interpretações a partir de novas pergunta se novos contextos. Nisso está sua riqueza e amplitude. No caso da metáfora da Ascensão, ela também pode ser lida a partir da linguagem do teatro. Tal interpretação é possível a partir da dica dada pelo texto dos Atos dos Apóstolos. Lucas, ao descrever a cena da Ascensão, afirma que, enquanto Jesus desaparecia entre as nuvens, dois homens vestidos de branco apareceram aos discípulos e disseram-lhes: “Homens da Galileia, por que ficais aqui, parados, olhando para o céu?”

Na metáfora da Ascensão, Jesus sai de cena. Durante três anos, ele havia sido o personagem central e os apóstolos os coadjuvantes e, alguns, a plateia. Agora Ele sai do palco. Jesus se retira para que eles assumam o protagonismo da missão. Aos discípulos e discípulas cabe agora serem os mensageiros e atuadores do Reino. Ele já fez a sua parte. Agora, a responsabilidade recai sobre os homens e mulheres que o acompanharam desde a Galileia e com Ele aprenderam a arte de atuar o Reino de Deus.

Mas, como bom mestre, Jesus não os deixa sozinhos. Deixa-lhes o Espírito Santo. E promete-lhes sempre estar presente para dirigir a sua obra prima para que o espetáculo do Reino não se perca. Agora, é o tempo da Igreja. Nada de ficar olhando para cima. Deus não está acima de todos. Ele está ao nosso lado. Tanto no irmão e na irmã com o qual solidariamente unimos as mãos quanto naquele que está caído e estende a mão para ser levantado. É hora de atuar. É hora de seguir o caminho de Jesus para que um dia nós também possamos ser elevados aos céus.

Sobre o autor

Vanildo Luiz Zugno

Frade Menor Capuchinho na Província do Rio Grande do Sul. Graduado em Filosofia (UCPEL - Pelotas), Mestre (Université Catholique de Lyon) e Doutor em Teologia (Faculdades EST - São Leopoldo). Professor na ESTEF - Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana (Porto Alegre)."

 

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