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Ninguém quer virar o Brasil

Miguel Debiasi

O analfabetismo político é um dos males que atormenta a história do Brasil. Atualmente, no contexto geopolítico latino-americano o Brasil é um vizinho isolado e sobre suspeita. A nível global não passa de um pária, a nação excluída da geopolítica mundial. Essa situação é causada por várias razões. A razão latente é da postura do presidente da república e do fracasso de seu governo na economia, na saúde, na política nacional e externa. Os culpados deste desgoverno é o analfabetismo político, a falta de cultura e formação, a parcialidade da justiça e da mídia corporativista, a religião cristã alienante e outras. O atual cenário demostra que este mal persistirá por longas décadas. É imprescindível seu enfrentamento pelos próximos governos.

Para demonstrar o tamanho do analfabetismo político bastaria analisar o discurso dos atuais governantes da nação e do Estado do Rio Grande do Sul, haveria conteúdo a sobra. Mas, optamos pelas ciências sociais e humanas como da filosofia, sociologia, antropologia e teologia que aprofunda reflexão para objetivar reação ao analfabetismo político que o povo é submetido. Iniciamos pela ciência da filosofia, aquela que fundamenta o “ser da coisa” ou a “razão dela existir”, como da instituição do Estado em sua função social, política, cultural e econômica. No percurso da história foram muitos os filósofos que pensaram a constituição do Estado como Platão, Locke, Maquiavel, Hobbes, Hegel e muitos outros.

Poderíamos iniciar com Platão com base no conteúdo das obras A Republica e as Leis. Com os filósofos do “contrato social” como Locke e Russel. Com o filósofo Hobbes que diz “o homem é o lobo do próprio homem”, indicando da necessidade da constituição do Estado para superação do estado de violência. Ficamos com Hegel (1770-1830), filósofo do Estado moderno que tem provocado uma reflexão contemporânea imensurável. Para isto recorremos a exímios estudiosos de Hegel de nosso tempo, os filósofos Manfredo de Araújo de Oliveira e João Alberto Wohlfart. Na luz destes brilhantes pensadores focamos algumas ideias para entender o contexto político que se encontra o Estado brasileiro.

Logicamente, a leitura de toda produção intelectual de Hegel é muito sugestiva para compreensão do Estado em sua função política. Hegel afirma que o Estado é uma instituição ética. O imperativo da ética é qualificar a coletividade. Exercendo essa função o Estado é mediação para a efetividade da consciência dos cidadãos. A autoconsciência de contribuir para o desenvolvimento humano, crescimento da política, da economia, da cultura proporciona ao cidadão chegar ao status de sujeito. O cidadão-sujeito é aquele que pensa e participa da efetivação do processo histórico de realização do bem comum. Ao constituir o cidadão-sujeito o Estado cumpre sua função ética e ontológica. Sua função ética porque zela pela justiça social que impede qualquer discriminação e injustiça contra o cidadão. Ontológica porque promove a sua razão de ser Estado, pela promoção de vida dos indivíduos e pela qualificação da consciência dos cidadãos. Ao governante cabe a função de governar para que todo cidadão desenvolva um espírito e consciência do bem-estar da coletividade.

O analfabetismo político denuncia a falta de espírito público dos governantes e governados. Ao promover o negacionismo da realidade da pandemia que vitimou mais de 300 mil brasileiros, o presidente da república contrapõe a função do Estado como uma instituição ética e ontológica. Ao contrapor-se a orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS), da ciência e da medicina retrata sua própria qualificação humana, da desqualificação para o ofício público. As inúmeras qualificações atribuídas ao presidente denunciam que nunca chegará a condição de estadista, pois lhe faltam muitas qualidades éticas e humanas.

É da natureza das ciências sociais a pergunta sobre as pessoas e como elas se comportam assim e não de outra maneira. A pergunta é a condição para chegar ao conhecimento do comportamento e da elevação da consciência humana. O analfabetismo político não é acidental, mas uma questão estruturante da política brasileira totalmente desqualificada como retrata as expressões antidiplomáticas: “ninguém quer virar a Venezuela”; “ninguém quer virar a Bolívia, a Argentina, China, comunismo e outras”. Tal discurso atente justamente ignorância política que não consegue ver o inaceitável eticamente, como: 68 milhões de brasileiros passando fome, 93 milhões sem trabalho e desassistido de qualquer previdência social, 310 milhões de vitimados pela covid, redução do PIB em 4,5%, explosão da violência, tolerância, feminicídio, desmatamento da Amazônia, absurdos preços dos alimentos, combustível e outros graves problemas sociais. O analfabeto político não consegue reagir a deplorável política pública que reluta ajudar com duzentos reais a quem passa fome por alguns meses e paga a vida inteira altos salários a casta social. Como senão bastasse a esta casta social lhe dá um auxílio mensal para o filé-mignon, caviar, bacalhau, cerveja importada, champanhe, iogurte e outros prazeres. Deus seja louvado, porque nenhum país latino-americano e do mundo quer virar o Brasil do governo Bolsonaro.   

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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