Você está ouvindo
Tua Rádio
Ao Vivo
14:00:00
Em Alta
18:00:00
 
 

Proteger os nossos ancestrais, os povos originários

Miguel Debiasi

A América Latina é um continente constituído de muitos povos originários. Com a colonização no Brasil se instalaram muitos povos como os europeus entre os séculos XIX e XX. Os povos que chegaram naquele período foram portugueses, espanhóis, italianos, alemães, turcos, libaneses e japoneses. Hoje, o Brasil continua a receber outros povos. Mas em pleno século XXI há brasileiros que ignoram os povos originários, os indígenas que vivem no país. O genocídio do povo Yanomami revela a política da bestialidade acompanhada de outro fermento, da ignorância cultural.

A colonização do território chamado Brasil iniciou em 1500, nessa data foi levado ao extermínio muitos povos indígenas. Estima-se que, na época da chegada dos europeus, fossem mais de mil povos indígenas, chegando a quatro milhões de pessoas. Segundo o censo do IBGE 2010, a população indígena encontrada no território brasileiro é constituída de 256 povos, falando mais de 150 línguas diferentes. Destes, 324.834 vivem em cidades e 572.083 em áreas rurais, o que é em torno de 0,47% da população do país. A maior parte dessa população distribui-se por milhares de aldeias, situadas no interior de 726 Terras Indígenas, de norte a sul do território nacional.

Para os antropólogos falar em povos indígenas no Brasil significa reconhecer basicamente seis condições: a) nestas terras colonizadas por portugueses, chamada de Brasil, já havia populações humanas que ocupavam esse território; b) é impossível saber exatamente de onde vieram, por isso, diz-se que são “originárias” ou “nativas”, porque já estavam nesse território antes da ocupação europeia; c) muitos grupos de pessoa que vivem atualmente no território brasileiro estão historicamente vinculados a esses primeiros povos; d) os povos indígenas que estão no Brasil e na América Latina tem uma longa história que se diferencia da civilização ocidental, que começou apenas 500 anos com a chegada dos portugueses; e) os povos indígenas tem uma história que resulta de relações entre os próprios homens e entre estes e o meio ambiente, história que foi drasticamente alterada pela colonização; f) a divisão territorial em países – Brasil, Venezuela, Bolívia e outros, não coincide com a ocupação indígena do espaço. Muitos povos que hoje vivem em uma região de fronteira internacional já ocupava essa área antes da criação das divisões entre países; é por isso que faz mais sentido dizer povos indígenas no Brasil do que do Brasil.

A expressão genérica de povos indígenas refere-se a grupos humanos espalhados por todo o mundo, e que são bastante diferentes entre eles. Na América Latina fala-se em povos indígenas, já na Austrália, emprega-se o termo aborígenes. Indígena ou aborígene, designa “originário e nativo” de determinado país, região ou localidade. Hoje, também se emprega o termo “Ameríndios” para referir-se a todos os índios das Américas do Norte, Central e do Sul. Os índios ou ameríndios são os povos indígenas das Américas. Índio é qualquer membro de uma comunidade indígena, reconhecido por ela como tal. Comunidade indígena é toda comunidade fundada em relações de parentesco ou vizinhanças entre seus membros e que mantém laços históricos e culturais com as organizações sociais indígenas.

O contato dos povos originários com a nossa sociedade provocou muitas mudanças no modo de viver dos povos indígenas. No contato a vida indígena teve mudanças que são preocupantes como: perderam suas línguas maternas e algumas comunidades hoje só falam o português. Há mudanças com relação à cultura dos índios, como uso de roupas, participar da missa, assistir televisão, operar computadores, jogar futebol, dirigir carro e outros hábitos que são próprios de outros povos. As mudanças estão também no âmbito político com um notável crescimento do número de indígenas no cenário político brasileiro. Em 2000, foram eleitos, entre vereadores, vice-prefeitos e um prefeito, 80 índios. O Governo Federal criou o ministério dos povos originários, sendo ministra a deputada federal a indígena Sônia Guajajara (PSOL-SP), sendo um reconhecimento público da importância dessas comunidades e povos nativos para todos os brasileiros.

Na situação de vulnerabilidade das comunidades indígenas, por iniciativa do Governo Federal em julho de 2006, foi criada a Coordenadoria Geral de Índios, subordinada à Diretoria de Assistência da Fundação Nacional do Índio (Funai). O objetivo da Coordenadoria era a proteção de grupos e povos indígenas em situações de extrema vulnerabilidade provocada pela expansão das atividades econômicas dos brancos em Terras Indígenas. Com essa missão foram criados órgãos, leis e programas de proteção aos povos indígenas e as Terras Indígenas. Na época da criação da Coordenadoria eram 305 povos vivendo no território brasileiro, a maioria concentrada na região da Amazônia.

Nos últimos anos o governo federal fez todo esforço político para o desmonte desses órgãos, leis e programas voltados à comunidade indígena. A extinção da política de proteção e preservação e outros programas governamentais, permitiu que as Terras Indígenas fossem exploradas pelo garimpo ilegal, mineradoras, agronegócio, extração de madeiras e outros. Infelizmente essa política de genocídio levou ao extermínio de povos indígenas, como dos Yanomami em Roraima.

Em janeiro o mundo ficou estarrecido ao ver 30 mil indígenas Yanomamis completamente desassistidos de qualquer programa social. Mais 500 bebês, crianças, jovens e adultos foram levados à morte pela situação de fome. Mais de 20 mil indígenas em total estado de desnutrição. Mais de 120 comunidades Yanomamis foram abandonadas pelo Governo Federal anterior que preferiu dar completo suporte para exploração do garimpo ilegal, poluindo as águas com mercúrio e as florestas tomadas por jagunços dos mineradores.

O genocídio do povo Yanomami conecta o Brasil com as mais bárbaras e atrozes experiências de extermínio de seres humanos. Pelas imagens divulgadas é impossível não associar aqueles corpos esqueléticos, de crianças e adultos com os ossos à mostra a vida por um fiapo. São cenas que nos associa as vítimas do horror nazista, exterminadas em campo de concentração. Pelas terríveis cenas tomamos conhecimento que o campo de genocídio o Auschwitz nos é familiar. Parece-nos que algumas autoridades políticas brasileiras se superam na bestialidade.

Face a esse brutal crime, uma nota de repúdio é insuficiente. Cabe as autoridades brasileiras investigarem os fatos e punir todos os culpados pelo genocídio dos povos indígenas. É o mínimo que o mundo inteiro espera dos órgãos públicos responsáveis e envolvidos no caso. 

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

Enviar Correção

Comentários

Newsletter Tua Rádio

Receba gratuitamente o melhor conteúdo da Tua Rádio no seu e-mail e mantenha-se sempre atualizado.

Leia Mais