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Cinco décadas em trajes de rainha da Festa da Uva

Caroline Rosa e Leonardo Portella

Texto de de Caroline Rosa e Leonardo Portella, alunos do Curso de Jornalismo da UCS

Foto: Divulgação

Nenhuma uma outra figura ilustra tão bem a Festa Nacional da Uva como a sua rainha. Da pioneira Adélia Eberle a Rafaelle Galiotto Furlan, última rainha coroada, 28 mulheres foram eleitas como símbolo de um dos maiores eventos nacionais. Com referências na Monarquia, as rainhas locais também ostentam coroas, acessórios e trajes exclusivos, criados por figurinistas da cidade. Nos últimos 50 anos, a moda na Festa da Uva continuou parecida, mas ganhou significados diferentes.

A figura de rainha da Festa da Uva surgiu em 1933 - dois anos após a primeira edição do evento. Adélia Eberle foi coroada como resultado de votação popular realizada por cupons publicados em jornais da época. Segundo relatos, o traje típico da soberana era de uma camponesa, mas  pesquisas recentes apontaram que o figurino de Adélia não correspondia ao padrão das mulheres daquele ano. Desde então, segundo o livro Figurinos de Vindima, da pesquisadora e figurinista caxiense Véra Stedile Zattera, as roupas vestidas pelas soberanas sempre buscaram homenagear o colono italiano na figura da mulher, com inspiração em gravuras e trajes de diferentes regiões da Itália.

Na publicação, Véra defende que os modelos sigam os mesmos padrões de vestimenta, uma combinação de saia rodada com corte na cintura, blusa, colete, avental e lenço. Os diferenciais de cada uma ficam em torno dos acessórios e significados dos trajes. O padrão das vestimentas iniciou em 1958 e a confecção dos trajes é feita por etapas: primeiro se pesquisa o significado que se quer dar ao traje e o perfil das soberanas eleitas. Então, um croqui é feito e, em seguida, a vestimenta ganha forma nas mãos de uma costureira.

Corina e Gazzana

Muito desse padrão de vestimenta se deve à costureira caxiense Corina Wainstein, que assinou a pesquisa e a costura dos trajes do final da década de 1950 a 2002 (com pausas nas edições de 1998 e 2000) e que segue até hoje como a que mais contribuiu para a criação dos figurinos das soberanas. No final da década de 1960, Corina ganhou a parceria do médico e artista plástico Darwin Gazzana. Ela pensava nos detalhes das peças e ele, que tinha talento para a arte e o desenho, colocava no papel as ideias da costureira. Na Festa da Uva de 1969, Corina e Gazzana foram os responsáveis por deixar a rainha Elizabeth Menetrier e as suas princesas com os vestidos curtos, os joelhos à mostra - uma ousadia para a sociedade na época.

A justificativa era a febre da minissaia, preferência das mulheres. O traje era uma homenagem à rainha antecessora, Silvia Celli, e era formado por um vestido de cetim duquesa (zibeline) bordado com fios de seda, em pontos cheios e rococó e adornado com pérolas. Elizabeth foi uma das primeiras soberanas a percorrer o Brasil para divulgar a Festa da Uva, o que atraía mais atenção ao traje. A parceria entre os dois durou até a morte de Gazzana, em 1983. Corina seguiu na costura dos trajes típicos até a década de 1990. Em março deste ano, aos 93 anos, a costureira faleceu.

As rosas que protegem a uva

Os trajes das atuais soberanas da Festa da Uva foram criados pelo estilista Walter Rodrigues. No verão de 2012, ao visitar um parreiral na localidade de Monte Bérico, Rodrigues se encantou com a produção de uvas e o significado da fruta para a região. Três anos depois, não imaginaria ser convidado a desenhar os trajes, e que usaria referências daquele passeio nas videiras para assinar a produção das vestimentas.

Natural de São Paulo, Rodrigues observou que havia rosas plantadas antes de cada parreira de uva. Curioso, foi atrás de explicações: além de enfeitar, as roseiras têm a função de proteger a uva de pragas que podem danificar a fruta e representar prejuízos. Com isso, o estilista definiu o conceito dos trajes das atuais soberanas da Festa da Uva: a rainha representa os parreirais, e as princesas, as rosas que os protegem. “A princesa está junto da rainha, está a acompanhando o tempo todo. As princesas são os jardins; tem até abelhas pequeninhas inseridas na roupa. E a rainha está propriamente vestindo o vinho”, define o estilista.

Além disso, Rodrigues baseou-se em pesquisas das historiadoras Cleodes Piazza e Véra Stedile Zattera.  “A roupa é uma das mais importantes linguagens, ela comunica, é portadora de grandes possibilidades de significação. As cores, o tecido e suas características, a ausência ou o luxo dos ornamentos, os detalhes artesanais – rendas, bordados, aplicações – contam histórias de heranças culturais, de fazeres manuais, de saberes, de gostos, de saudade”, argumenta.

Para ele, os trajes da rainha e das princesas da Festa são importantes por representarem a interlocução entre a história vivida pelos antepassados, que venceram a luta por um novo começo na região, e a história atual, que tem o compromisso de preservá-lo. “O traje não é uma fantasia de princesa ou rainha. É um traje: ele tem que fazer a ligação entre o humano que porta o traje e toda a solenidade que ele evoca e transparece”, defende.

Pesquisa dos trajes oficiais das últimas edições da Festa da Uva.

2016 - Pesquisa feita pelo estilista Walter Rodrigues e confeccionado por Lola Salles

2014 - Pesquisa de Véra Stedille Zattera e costuras do Atelier Rosa Ponto. Bordados de Rosa Demori e Marcia Pasa.

2012 - Pesquisa da estilista e modista Maria Ilse Adami

2010 - Pesquisa dos trajes pela historiadora Tânia Tonet e confecção pelas costureiras Maria Ilce Gens Adami e Diva Chiesa Araldi.

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