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Tudo, menos ele

Gislaine Marins

Ele: o Matteo Renzi. Foi assim na Itália: as pessoas estavam dispostas a tudo, desde que mandassem Renzi para casa.

Venceram.

Feliz, satisfeita, uma parte dos vitoriosos dizia: “a Itália para os italianos!” - essa seria a parcela mais extremista. Já os que se professavam nem de direita e nem de esquerda, mas também contra o centro, que por décadas governou a Itália, diziam: “vamos asfaltar tudo!” – “asfaltar” é o eufemismo usado por pessoas que acreditam ser melhores que os eleitores de extrema-direita para dizerem que vão acabar com tudo. Eles dizem isso no sentido simbólico e concreto. Simbólico quando são acusados de serem seguidores do partido do palavrão, concreto quando prometem mudar tudo o que existe. “Mudar”, neste caso, também é um eufemismo.

Eles venceram. Levaram 90 dias para formar o governo. A desconfiança do mercado aumentou. Os capitais estão sob ataque especulativo. A União Europeia, pela primeira vez, reprovou o orçamento da Itália. Os projetos em andamento continuaram em andamento. As crises ligadas a fenômenos naturais e a acidentes graves foram administradas, mas as críticas sobre a eficiência e a competência postas em campo não foram muito diferentes das críticas que Renzi sofria.

Acho que os italianos trocaram seis por meia dúzia, com juros embutidos.

O partido do palavrão, contra tudo e contra todos, vem caindo. Tinha sido o mais votado. O partido de extrema-direita, que compôs a coalizão para formar o governo, quase dobrou as intenções de voto desde que começou a governar. Hoje é o partido com maior índice de popularidade no país.

Quando minha sogra foi ao Brasil pela primeira vez, disse: “parece a Itália de trinta anos atrás”. Ela pensava na Itália do boom econômico, nós vivíamos os primeiros anos do milênio. Havia otimismo na Itália dos anos Sessenta e no Brasil do início do século. Todas as famílias felizes se parecem, dizia Dostoiévski.

Agora os tempos são outros: parecemos a Itália de seis meses atrás, mas um pouco pior, com mais barbárie, com mais descontrole, com mais violência, com mais ódio, com mais linchamento, com mais moralismo, com mais hipocrisia.

Um país, é claro, nunca é igual ao outro, embora se pareçam nas tragédias. Estou pensando em Dostoiévski, mas ao contrário. Pode ser que eu esteja errada. Em relação a Dostoiévski, me refiro. Talvez a Itália e o Brasil não se pareçam tanto assim na tragédia. Talvez na Itália a situação não seja tão trágica.

Sobre o autor

Gislaine Marins

Doutora em Letras, tradutora, professora e mãe. Autora de verbetes para o Pequeno Dicionário de Literatura do Rio Grande do Sul (Ed. Novo Século) e para o Dicionário de Figuras e Mitos Literários das Américas (Editora da Universidade/Tomo Editorial). É autora do blog Palavras Debulhadas, dedicado à divulgação da língua portuguesa.

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