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O silogismo da cama

Miguel Debiasi

Já ouvimos inúmeras vezes que o sono é essencial para o crescimento humano, equilíbrio psíquico, emocional e metabólico. Sabemos que durante o sono o corpo humano trabalha para manter o equilíbrio do sistema imunológico, endócrino, neurológico. A medicina afirma que o sono combate a obesidade, diabetes, hipertensão, depressão e ajuda fortalecer o mecanismo da memória. Temos ciência que para um sono desejável precisamos das mínimas condições, como uma cama de qualidade. Também nossa humildade diz que não precisamos de uma cama igual a do vice-presidente da República que gastou R$ 194 mil para os cofres públicos. Seguramente, se o brasileiro tivesse a cama do vice-presidente da República ninguém sofreria de insônia.

O filósofo grego Aristóteles foi um dos primeiros teóricos a definir à lógica. Em razão de seus estudos hoje nos referimos a ela como “a lógica aristotélica”. Para Aristóteles a lógica mostra como procede o pensamento quando pensa, qual a estrutura do raciocínio, quais são os seus elementos, como apresentar demonstrações, que tipos e modos existem, e de que é possível fornecer demonstrações e quando. Numa forma menos estruturada, o filósofo e ator grego Alexandre de Afrodísia definiu a lógica como instrumento mental necessário para enfrentar qualquer tipo de investigação. Para ambos filósofos, a lógica permite formular juízo de verdadeiro e falso sobre coisas que estão relacionadas entre si. A aplicação deste instrumental lógico nos ajuda analisar a realidade das coisas, como as desigualdades entre pessoas e classes sociais. 

A lógica aristotélica nos leva a formular silogismos em geral. A organização de silogismo dá-se a partir de duas proposições, chamadas de premissas, das quais se obtém por inferência uma terceira, que é a conclusão. Há um silogismo bastante conhecido na filosofia que é: todos os homens são mortais; os gregos sãos homens; logo, os gregos são mortais. Na aplicação do silogismo formulamos raciocínios e juízo que nos levam a uma conclusão verdadeira. No silogismo de Aristóteles há sempre o uso de três termos, dos quais funciona como uma espécie de dobradiça unindo os outros dois.  Entendemos isto empregando o nome de Aristóteles: a primeira premissa – se todos os homens são mortais; a segunda premissa – e se Aristóteles é homem; e a conclusão – então Aristóteles é mortal.

Como percebemos o fato de Aristóteles ser mortal é consequência que brota necessariamente de ser estabelecido que todo homem é mortal e que Aristóteles, precisamente é homem. E, assim, sobre o termo ‘homem’ é o termo sobre o qual se alavanca a conclusão. Os exemplos que aqui usamos são meros instrumentos ilustrativos para nossa maior compreensão, sejam de coisas universais, particulares, modos de vida e outras modalidades. A lógica filosófica tem esta função de demonstrar qual é a essência do raciocinar e pensar, este exercício nos leva a correção formal a respeito dos valores, da verdade científica e dos juízos que contem sua razão.

Entre 2019 e 2020, o Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente da República, general Hamilton Mourão (PTRB), investiu dinheiro público na compra de artigos esportivos, esteiras elétricas, louças e vários jogos de cama. Segundo informações disponíveis nos portais de pregões governamentais e de compras, do Mistério da Economia, em dois anos, os gastos da residência do vice-presidente totalizaram R$ 2,3 milhões aos cofres públicos. Em 2019, o montante chegou a R$ 1,7 milhão. No primeiro semestre de 2021 o montante chega a R$ 590 mil. Entre as 22 compras por pregão, três editais foram destinados para a aquisição de enxoval do vice-presidente: colchas, saias para cama, cobertores, travesseiros, toalhas e colchões, lençóis de brancos de algodão egípcio de tamanho Queen que custaram uma merreca de R$ 200 mil.

Se aplicarmos o silogismo aristotélico ao fato do Mourão, assim seria: primeira premissa – Se Mourão precisa de cama de 200 mil; segunda premissa – e se Mourão é brasileiro; a conclusão – então todos os brasileiros precisam de cama de 200 mil. A lógica de Aristóteles mostra que há uma irracionalidade entre: os brasileiros que imploram um mísero auxílio emergencial de R$ 150,00 por três meses e com Mourão que se dá ao luxo, além receber o alto salário de vice-presidente e aposentaria de general, usufruir de uma cama de 200 mil à custa dos cofres públicos. A conclusão lógica que chegamos com juízo de valores da cama de 200 mil do vice-presidente é a seguinte: Aristóteles é culpado por ter-nos ensinado a pensar e raciocinar demostrando que existe uma realidade de tamanha desigualdade socioeconômica, em que uns usufruem de privilégios e mordomias financiados pelos recursos públicos e outros, penam por total carência material e de auxílio.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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