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Bastaria um prato de sopa

Miguel Debiasi

 

A paixão pela arte culinária tem atravessado toda história da civilização. Desde os primórdios da humanidade a busca por uma alimentação saudável tem desafiado os povos. A preocupação com a saúde levou os povos a cultivarem hábitos alimentares saudáveis. Em nosso tempo é notório a busca pelas ricas iguarias dos povos para a melhor qualidade de vida. Em contrapartida, é desafio saciar a fome de um bilhão e meio de pessoas que passam fome diariamente.

Segundo dados divulgados pelo o Estado da Insegurança Alimentar e Nutricional no Mundo, na última década aumentou o número de pessoas que passa fome. A média na última década é o aumento de 10% de faminto por ano. O aumento deve-se a crise econômica provocada pela falência de grupos financeiros especulativos norte americano entre 2007 a 2010 que continua impactando na economia mundial. Os grupos econômicos praticavam a concentração de alto valores voláteis e não de bens permanentes. A saúde do sistema econômico vem da geração de empregos, produção de bens de consumo, locação de recursos para que a economia funcione de forma estabilizada. Na contramão desta função da economia o sistema financeiro especulativo nas primeiras décadas do terceiro milênio que gerou a crise econômica mundial. A reinvenção de um sistema econômico exige nova concepção de economia e de maior função pública e social.

O Papa Francisco diz que a economia capitalista globalizada gerou o maior caos e indiferentismo social com a miséria de milhões de seres humanos. A ideia neoliberal de crescimento econômico tende a gerar automatismos e a homogeneizar, a fim de simplificar os processos e reduzir custos. A análise da crise econômica mundial exige olhar para o todo que é superior à parte. O processo econômico seguro considera a realidade ampla, como a ecologia, ecossistema, análise dos contextos humanos de pobreza e institui projetos para uma progressiva mudança planetária com base nos princípios do acesso ao bem comum a todos grupos sociais e povos. O racionalismo moderno submeteu as instituições privadas e públicas a um modelo econômico que traz benefícios a poucos e mostra-se incapaz de pensar uma economia integral e solidária. A globalização da economia neoliberal é um processo que distancia as classes sociais e a humanidade. É preciso pensar um modelo econômico mais integrado ao ecossistema e mais integrador de vidas humanas para as melhores condições sociais.

O filósofo camaronês Achille Bembe diz que mundo dividido não vai durar, a menos que a humanidade se empenhe na tarefa de garantir aquilo que bem poderia chamar de “reserva da vida”. É possível um novo pensamento e uma nova cultura para que o mundo seja a história de todos os seres humanos. Temos que admitir que a vocação humana é para realizar a vida sem máscaras de todos os viventes e para proteger contra todos os perigos de mortes e escravidões. A tarefa é pensar um mundo e uma história em que todos os seres humanos existem por inteiros e de serem cada qual proximidade e realizar a partilha de tudo que existe e de tudo que temos. A globalização nos diz que o mundo é comum e que toda política, economia, todo pensar devem remeter ao processo de recomposição das partes que a história amputou e a reparação de laços que foram rompidos para elevar uma parcela da humanidade e submeter outra a escravidão e a miséria social.

Para o Papa Francisco e filósofo Achille Mbembe é necessária uma reparação humana e social, pois, a história com seus sistemas deixou lesões e marcas profundas em nossa humanidade. Estamos diante de um processo que asfixia, morte súbita e da exclusão das minorias e de povos inteiros. O atual sistema político, econômico e cultural impede que a humanidade inteira seja uma grande comunidade de irmãos e que os saberes diferentes construam o comum, o coletivo e um projeto de humanidade universal. A reinvenção do mundo, da história é tarefa e questão universal que exige abertura para o outro e o reconhecimento que passa pela inclusão social. Todas as diferenças precisam pensar num projeto comum, de comunidade e de recuperação de qualquer situação de empobrecimento, de racismo, de exclusão social, destruição ecológica e outras.

O reinício para uma nova humanidade perpassa a tudo e a todos. Estamos diante de um sistema de esgotamento total da fontes vivas e da vida, qualquer reação deixará vestígios da construção de um mundo que seja para todos e a história seja história para todos. Neste desafio toda ética como a cristã objetiva que posso satisfaz-me com os bens necessários para a vida digna. O estilo de vida consumista provoca a exclusão social, leva ao esgotamento de bens maturais e desequilíbrio do ecossistema. O crescimento da exclusão social convida a humanidade a lutar por um modelo econômico de vida em comum, e este projeto inicia pela vontade de garantir diariamente a todas pessoas, ao menos um prato de sopa. Um prato de sopa para todos já seria um grande milagre de nosso tempo.

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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