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A espiritualidade do serviço

Miguel Debiasi

A espiritualidade do serviço

O ser humano cultiva uma infinidade de espiritualidades. A espiritualidade cristã é cultivada pela oração, celebrações, contemplação, leituras, atitudes e crença na santíssima Trindade. A espiritualidade antropológica é cultivada pela própria esperança inerente a vida humana. É impossível descrever todas espiritualidades com suas maneiras de serem cultivadas. Todo ser humano recorre a uma espiritualidade religiosa ou antropológica. O serviço ajuda a fortalecer a espiritualidade cristã. Hoje, servir a luz do Evangelho é desafio para os cristãos.

O Papa Francisco em carta apostólica patris corde – com coração de pai, apresenta são José como modelo de serviço por confiar-se plenamente a missão e a providência de Deus. Historicamente, são muitos os cristãos que se colocaram totalmente a serviço da obra do Reino de Deus como são José. A espiritualidade do serviço é constituída pelos ensinamentos de Jesus, como: “Eu vim para servir e não para ser servido” (Mateus 20,28). Outro ensinamento: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (João 15,13). A qualificação do cristão passa pela forma como sua fé serve o projeto do Reino de Deus. Apóstolos e incontáveis cristãos derramaram seu sangue servindo o Evangelho do Reino de Deus. O crescimento do cristianismo está em milhões de fiéis que se dedicam ao serviço do Evangelho.

Frei Patrício Sciadini nos fala da necessidade da – Espiritualidade do avental. A Espiritualidade do avental fundamenta-se no gesto de Jesus de lavar os pés dos discípulos (João 13,1-15). Lavar os pés do outro era uma prática comum do povo hebreu, judeus e dos primeiros cristãos, traduzido como gesto de hospitalidade. A hospitalidade com o peregrino, viajante e estrangeiro era a manifestação de amor ao outro e a Deus (Lucas 7,38). Em tempo não muito distante os pais e filhos lavam os pés uns dos outros numa bacia. No final da jornada de trabalho lavar os pés dos outros como dos pais e pessoas idosas era um ato sagrado. Da partes dos filhos, o ato manifestava respeito e amor pelos genitores. Esta experiência marcou a vida e a formação de muitas pessoas.

Este gesto entre familiares diferencia-se da obrigação dos escravos de lavar os pés dos seus senhores. Os senhores consideravam os escravos sua mercadoria. Normalmente, o ato de lavar os pés cabia as escravas jovens e dos escravos mais resignados. O ato doutrinava os escravos e em muitas circunstâncias eram forçados a saciarem os desejos afetivos do patrão. A prática era uma progressiva intensificação do apetite dos senhores que abusavam e violentavam as escravas e escravos. A vítima, cheia de virtude, seria incapaz de violência e reação ao terror do abuso dos seus senhores. O filósofo camaronês Achille Mbembe registra que negros eram castrados para se tornarem instrumento e objeto passivo da fruição do senhorio. Para muitos historiadores este registro define bárbaro ato do escravo lavar os pés do patrão. A história de muitos nobres senhores e de suas descendências carregará para sempre o horror da escravidão. Ato abominável que jamais cairá no esquecimento da história humana.

Frei Patrício registra à importância da espiritualidade do avental. No Evangelho de João era antes da festa da Páscoa dos Judeus, portanto, um momento solene da vida Jesus e dos seus dá-se o lava pés, durante a última ceia (João 13,4-5). Era um momento carregado de amor de Jesus pelos seus, também de angústia pelo futuro que se aproxima, da traição de Judas e da condenação das autoridades religiosas judaicas que o entregam aos oficiais romanos para a crucificação. João nos ajuda a entender do significado da espiritualidade do avental com base na última ceia. Frei Patrício chama atenção para os sete verbos usados do gesto de Jesus lavar os pés: ‘levantou-se’ da mesa, ‘tirou’ o manto, ‘tomou’ a toalha, ‘cingiu-se’ com a toalha, ‘derramou’ água na bacia, e se ‘põe a lavar’ os pés dos discípulos. Cada verbo revela a diakonia de Jesus e que recordam os ensinamentos do Mestre resumidos no lava pés.  

Qualquer hermenêutica teológica e eclesiológica indicará que servir dá vida e atualização do ensinamento de Jesus deixado para Igreja e humanidade. Jesus lavando os pés dos discípulos dá o exemplo mais lúcido e contundente que resume sua vida através da diakonia - do serviço. Ao deixar este ensinamento no final de sua vida com a necessidade da diakonia - do serviço, os seus apóstolos deveriam servir um ao outro e a toda humanidade. Hoje, para os seguidores de Jesus, crer é servir. Servir os outros desenvolve a espiritualidade operativa que viveu Jesus de Nazaré. Toda espiritualidade que serve é libertadora e transformadora. A espiritualidade do serviço confronta a sociedade moderna que deseja ser servida por uma religião e por um espiritualismo que faz arranjos sociais não libertando os cristãos. O gesto de Jesus é de todo sempre libertador e quem o praticar como ato de amor ao próximo torna-se mais livre e evidencia sua fé transformadora. Fé transformadora é o que pede a mensagem de Jesus e o contexto sociorreligioso brasileiro.   

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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