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Pais sobre rodas: o desafio dos homens que mudaram suas vidas através do basquete

por Alice Corrêa

Três pais contam suas histórias e sobre como superaram os desafios diante da deficiência física

Equipe da @adefisg durante treino em Caxias do Sul
Foto: Alice Corrêa/Tua Rádio São Francisco

Três homens, pais de família, inspiradores, unidos pelo mesmo propósito: o esporte. Mas não é qualquer esporte. O basquete, criado em 1891 nos Estados Unidos faz parte da vida de muitos e, para quem conhece a modalidade, sabe que a atividade depende de muita habilidade. Mas a história dos nossos protagonistas vai mais além. Você já se imaginou jogando basquete? Ou melhor, jogando basquete sobre rodas? Com certeza, não é para qualquer um, e nós vamos provar em quadra e com a história dos nossos campeões como é possível para quem tem determinação.

Diego Paim, Sebastião Abreu e Gilberto Bastian possuem algo em comum: a deficiência física. Porém, os obstáculos do dia a dia não foi uma opção para fazê-los parar. Eles viram a oportunidade no esporte, no prazer em praticar o basquete, uma nova forma de viver.

Nascido em uma família unida e amorosa, Diego sempre teve uma paixão pelo futebol. Jogava pelas equipes de base de clubes como Caxias e Juventude. No entanto, sua vida mudou drasticamente quando, aos 17 anos, ele se envolveu em uma briga e sofreu seis tiros. Esse trágico evento resultou em sua paraplegia, marcando o início de uma nova e difícil fase.

"Quando eu tinha 17 anos, para 18, me envolvi numa briga e acabei levando seis tiros", relembra Diego. Esse acidente o forçou a enfrentar a dura realidade de uma deficiência permanente. A adaptação ao novo estilo de vida foi desafiadora, mas Diego encontrou um novo propósito através da fisioterapia e do basquete em cadeira de rodas. "Foi um suporte que me ajudou muito. Conheci outras pessoas na mesma situação e comecei a ver a vida de um ângulo diferente", diz ele.

A entrada no basquete não foi imediata. Após uma primeira experiência desanimadora em um jogo, Diego hesitou, mas foi encorajado por colegas de equipe a participar de treinos. "Eu fui, conheci o basquete e não larguei mais. Estou há 14 anos no esporte e ele mudou completamente a minha vida", conta.

A transição do acidente para a prática do basquete foi difícil, tanto para Diego quanto para sua família. No entanto, Diego explica que sua principal motivação era estar vivo e próximo à sua família. "O importante era estar vivo, perto da minha família e da minha filha. O basquete me ajudou a encontrar um novo propósito e a ver a vida de maneira mais positiva", afirma.

O esporte não só ofereceu a Diego uma nova perspectiva de vida, mas também o transformou como pessoa. "O esporte me mudou como cidadão, como pai, como filho. Aprendi a dar mais valor à vida e às pessoas ao meu redor", reflete. Ele também destaca a importância do apoio da família durante essa jornada. "Nada é impossível. Com força de vontade e o apoio da família, podemos superar qualquer adversidade."

Para a mãe, Genessi Urbano do Santos e a filha, Emily Paim, a experiência foi um misto de choque e orgulho. Genessi, comovida, lembra do momento em que recebeu a notícia do acidente. "Foi um choque. Sempre tive orgulho do meu filho, e mesmo com o que aconteceu, Deus nos trouxe de volta. Meu orgulho por ele só aumentou", diz Genessi. Emily, sua filha de 17 anos, vê seu pai como uma fonte de inspiração. "Ele transformou uma tragédia em algo positivo para ajudar outras pessoas. Isso traz muito orgulho e motivação", compartilha.

Desde cedo, Sebastião Abreu, carinhosamente chamado de Tião pelos amigos e familiares, enfrentou os desafios impostos pela deficiência com uma atitude determinada. A infância não foi fácil; ele enfrentou o preconceito e a exclusão, especialmente durante seus anos escolares, quando os colegas o chamavam de "saci". Esse tipo de bullying fez com que ele se afastasse da escola, mas não o impediu de buscar novos caminhos para sua vida.

Foi no basquete, no entanto, que Tião encontrou um propósito. Com 22 anos de prática, a paixão pelo esporte o ajudou a superar muitos dos desafios que enfrentou ao longo de sua vida. A trajetória no basquete começou de forma inesperada, quando um amigo o levou para uma sessão de treino. Inicialmente, Tião duvidou de sua capacidade, mas a persistência e o apoio da equipe fizeram com que ele se apaixonasse pelo esporte. Desde então, o basquete se tornou uma parte fundamental de sua vida.

Tião destaca que o esporte não apenas o ajudou a lidar com o preconceito, mas também lhe deu um sentido de pertencimento e propósito. Ele não se limitou ao basquete; sua trajetória inclui uma notável carreira na canoagem, onde foi vice-campeão mundial no Canadá, e atualmente continua se dedicando à natação e ao basquete.

O apoio da família foi crucial ao longo de sua jornada. Sua esposa, Luciana Gonçalves Brites, de 46 anos, e seus dois filhos, Daniel e Diogo, sempre estiveram ao seu lado. Luciana conta que, desde o início do relacionamento, apoiou a carreira esportiva de Tião e até participou das atividades de canoagem. Para ela, o envolvimento de Tião com o esporte foi natural e sempre contou com seu apoio irrestrito.

Para seus filhos, Tião é uma fonte de inspiração. Daniel, o filho mais novo, pratica basquete no SESI e planeja seguir carreira em educação física para ajudar outras pessoas com deficiência. A história de Tião não apenas moldou a vida de seus filhos, mas também demonstrou a importância da persistência e da adaptação diante das adversidades.

Gilberto Bastian sofreu um acidente grave há dez anos, quando caiu de um pinheiro a 12 metros de altura. O impacto resultou em uma lesão medular, e, há três anos atrás, uma escara levou à amputação de seu pé direito. "Foi um período muito difícil. Com a lesão medular, já era complicado, e a amputação tornou tudo ainda mais desafiador", compartilha Gilberto. O acidente não só mudou seu corpo, mas também o foco de sua vida, especialmente no esporte.

O futebol, uma paixão antiga, foi substituído pelo basquete em cadeira de rodas. "De início, eu pensava em desistir. Não conseguia imaginar como poderia jogar basquete na cadeira de rodas", confessa Gilberto. Mas com o incentivo de sua esposa e amigos, ele persistiu. "O esporte foi essencial para mim. Ele me mostrou que o impossível pode se tornar possível com dedicação", afirma.

Eli Bastian, que conheceu Gilberto em 2014, viu sua vida mudar radicalmente após o acidente. "Quando o Gilberto se acidentou, éramos apenas um casal normal, mas tudo mudou de repente", lembra. Ela estava ao lado dele durante a recuperação, enfrentando o desafio de se adaptar à nova realidade. "O médico nos disse que Gilberto poderia não sair da mesa de cirurgia. Eu era jovem e não sabia o que esperar, mas decidi ficar. Acredito que o amor pode suportar tudo", revela Eli.

A mudança de papel para Eli foi drástica. De namorada, ela se tornou cuidadora e, mais tarde, esposa e mãe. "Eu tive que aprender a cuidar do Gilberto e, depois, a conciliar isso com o trabalho e os estudos. Descobri minha vocação em enfermagem através dessa experiência", conta Eli.

Hoje, a família Bastian é um exemplo de como enfrentar e superar obstáculos. Com a chegada de sua filha, o casal encontrou novas alegrias e desafios. Eli destaca como Gilberto se tornou um pai exemplar, surpreendendo a todos com seu cuidado e dedicação. "No começo, eu estava assustada com a ideia de deixar um bebê com um pai que tem lesão medular, mas Gilberto se saiu muito bem. Ele é um pai dedicado e amoroso", afirma Eli.

Inspiração para pais e mães

A mensagem de Diego para pais e mães é clara e inspiradora. "A vida é adaptável. Mesmo passando por momentos difíceis, temos a chance de mudar e buscar o que realmente desejamos. Com o apoio da família e força de vontade, é possível superar qualquer obstáculo e viver uma vida plena e feliz."

Em uma mensagem tocante para outros pais, Tião enfatiza que a vida continua, independentemente dos obstáculos. "Não abaixe a cabeça. A vida é bonita e o que importa é viver com saúde e aproveitar o que temos", afirma. Ele acredita que o esporte tem um papel crucial em ensinar lições valiosas e em proporcionar uma vida mais rica e gratificante.

Gilberto, por sua vez, conclui sua mensagem com uma lição de vida. "O impossível não existe. Com força de vontade e determinação, podemos superar qualquer desafio. Acredito que é preciso tirar o impossível da mente e buscar soluções. Minha história é um exemplo disso", conclui.

O basquete sobre rodas

Uma das principais diferenças entre o basquete em cadeira de rodas e o basquete convencional é a forma como a bola é manipulada. Enquanto no basquete tradicional o jogador deve driblar a bola continuamente, no basquete em cadeira de rodas o atleta tem a opção de dar dois toques na bola sem driblar antes de passá-la ou arremessá-la. Isso se deve às limitações de movimentação das cadeiras de rodas, que exigem ajustes nas regras para garantir um jogo justo e competitivo.

O restante das regras do basquete em cadeira de rodas segue de perto as do basquete convencional. As dimensões da quadra, as medidas da cesta e as regras de jogo são praticamente idênticas, proporcionando uma experiência similar para jogadores e espectadores. O objetivo continua sendo marcar pontos ao arremessar a bola na cesta adversária, e as estratégias de defesa e ataque permanecem comparáveis às do basquete tradicional.

Em Caxias do Sul, o basquete em cadeira de rodas é promovido com vigor pela ADEFISG. Com 14 anos de experiência na organização de jogos e treinos, a equipe é um pilar importante na comunidade esportiva inclusiva da região. O atual treinador e atleta, Diego Paim, que está à frente da equipe há dois anos, destaca a importância de manter o esporte acessível e aberto para todos. “Os treinos são totalmente gratuitos e abertos a todas as pessoas com deficiência. Oferecemos uma oportunidade para que todos possam experimentar o esporte e se integrar à equipe”, explica.

Os treinos acontecem duas vezes por semana: às segundas e quartas-feiras, das 19h às 21h, no Ginásio do Vascão. “Estamos sempre à procura de novos talentos e pessoas interessadas em participar. Seja como atleta ou apenas para experimentar o esporte, todos são bem-vindos”, convida o treinador.

Para aqueles interessados em se juntar à equipe ou simplesmente conhecer mais sobre o basquete em cadeira de rodas, a equipe mantém uma página nas redes sociais onde divulgam informações sobre treinos e eventos, no @adefisg. O acesso ao esporte é uma forma de promover a inclusão e oferecer uma plataforma para que pessoas com deficiência possam se desenvolver e se integrar socialmente.

O basquete em cadeira de rodas não é apenas uma atividade esportiva; é uma forma de empoderamento e inclusão, oferecendo aos participantes uma maneira de desafiar suas próprias limitações e celebrar suas conquistas.

Acompanhe também:

https://www.youtube.com/watch?v=cNvMsjuqbQY

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