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A espiritualidade social

Miguel Debiasi

Inúmeras vezes ouvimos frases como estas: a espiritualidade é a seiva que alimenta a vida. A espiritualidade é o fundamento na experiência com Deus. A espiritualidade é o alimento da vida cristã. A espiritualidade é a intimidade com Deus. A espiritualidade é o combustível do ser humano. Ao menos para o cristão as afirmações são incontestáveis. Essa ideia e experiência de espiritualidade deveriam iluminar toda vida humana.

As compreensões de espiritualidade são amplas. O termo latim, spiritus, significa sopro ou respiração. Um sopro que remete ao movimento, capaz de nos retirar do peso das coisas materiais e de sua esterilidade. Na narrativa da criação o Senhor deu a pessoa o fôlego da vida: “Então, formou o Senhor Deus ao homem do pó da terra e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente” (Gênesis 2,7). A espiritualidade está ligada a “um sopro de vida”, esta é das definições mais comuns e a encontramos ao visitar a origem da palavra – spiritus. Ao lermos a narrativa da criação observamos entre tudo o que foi criado pelo Criador, o corpo humano foi a única coisa que Deus formou com as próprias mãos. Além do que, precisou de algo a mais que a matéria, o corpo, “um sopro da vida”, do espírito, da respiração. Sem espírito, sem respiração a vida inexiste apenas corpo, material.

Há a espiritualidade na experiência transcendental, da sintonia com o ser Maior e que se cultiva independente da prática religiosa. Da sintonia espiritual que alcança a plenitude com relação ao transcendental. Vive-se a espiritualidade como uma dimensão humana que constitui um modo de profunda essência e aspiração. O filósofo materialista francês André Comte-Sponville (1952) fala de uma “espiritualidade sem Deus” no sentido de uma abertura para o ilimitado. Aquela espiritualidade que concede à pessoa a dimensão de mistérios e ilimitada da existência que não precisa submeter-se e passar por uma argumentação religiosa. A espiritualidade que vai além do intelecto, escreve o filósofo contemporâneo Comte-Sponville.

Hoje se tem a percepção que a espiritualidade refere-se a uma experiência que envolve a totalidade do ser humano, por isso, algo muito estudada. A Organização Mundial da Saúde (OMS) com pesquisas vêm aprofundando estudos sobre a espiritualidade enquanto elemento, experiência e dimensão constituinte e multidimensional de saúde humana. As investigações apontam que o bem-estar espiritual é considerado uma dimensão do estado de saúde, com suas relevâncias e benefícios corporais, psíquicos e sociais.

Enfim, o que é a espiritualidade? Talvez todos tenham sua própria ideia e sua experiência. Numa compreensão geral, a espiritualidade pode ser definida como a busca humana por um sentido e significado pleno para a vida por meio de experiência e relações intangíveis. A espiritualidade tem haver com o próprio sentido da vida e que na busca dessa essência ocorre abertura para a comunhão com Deus. Qual a importância e as implicações da espiritualidade? A maior importância é que a espiritualidade nutre a pessoa e esta descobre os mistérios da sua existência. A implicação da espiritualidade identifica valores e ações para constituir-se uma experiência fundante e para uma vida alegre, realizada.

Quanto à espiritualidade cristã, aquela constituída pelo encontro com Jesus Cristo, vai muito além dos ritos religiosos, sacramentais e pertença a comunidade. A espiritualidade alicerçada na experiência da fé amor, da fé compaixão, da fé serviço, como o Mestre demonstrou ao lavar os pés dos seus discípulos (João 13,14). No seguimento da atitude de Jesus Cristo vive-se a genial e estupenda espiritualidade libertadora. É a espiritualidade da conversão pessoal que provoca a conversão social. A espiritualidade que desencadeia uma vivência e que permite dignidade de cada ser humano. A espiritualidade que muda a pessoa e gera novas estruturas sociais justas e dignas. A espiritualidade de Cristo destruiu as estruturas injustas e indicou um novo estilo de vida.

Então, a espiritualidade cristã é aquela do acontecimento espiritual, que plenifica o Evangelho, que realiza de forma definitiva o Reino de Deus em vida. Como chegar a essa espiritualidade cristã? O caminho para tanto, é construindo um profundo encontro com Cristo, que gera consciência de que é preciso buscar respostas alternativas frente aos problemas que estamos submetidos, como da manipulação religiosa. A espiritualidade que Cristo viveu de plena comunhão com Deus Pai é vida. É luz. É fermento. É sopro que fazer viver a matéria, o corpo, que se sente responsável pela construção do mundo novo, da nova humanidade (João 17).

 

Sobre o autor

Miguel Debiasi

Frade da Província dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Mestre em Filosofia (Universidade do Vale dos Sinos – São Leopoldo/RS). Mestre em Teologia (Pontifícia Universidade Católica do RS - PUC/RS). Doutor em Teologia (Faculdades EST – São Leopoldo/RS).

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